Uma semana depois, Florismal morreu. Quando um novo dia clareou aquela sala triste, todos os sub-homens continuaram a gemer ou a sorrir os seus sorrisos de caveira, todos menos Florismal, que a morte surpreendera no sono. O seu rosto conservava a expressão de dignidade. Eugénio pagou-lhe o enterro, comprou-lhe uma sepultura modesta. Voltou do cemitério pensando nos seus mortos. Era uma tarde de fim de Verão, a luz do Sol tinha uma doce qualidade de madureza, o ar macio e levemente azulado. Eugénio sentia uma calma aceitação dos homens e das coisas. Tudo estava bem e ele não desejava mais nada além da posse daquela paz interior que começava agora a entrever. A morte não o assustava. A sua sede de sucesso parecia extinta. Já não sonhava mais com a glória e principiava a não ter medo da vida.
Sentia um desejo de ternura, de bondade, de gestos mansos. Mas sabia também que aquele instante ia passar, que amanhã haveria no ar, na luz do Sol, e na face das coisas um elemento qualquer de estranheza, de hostilidade, que havia de provocar nele outras reacções. Viriam momentos de fraqueza e desânimo. Surgiriam dificuldades, motivos de irritação. Os seus nervos seriam mil vezes postos à prova. A dúvida tornaria a entrar-lhe na alma. Mas Olívia ainda estaria na sua memória, para ajudá-lo a vencer as crises, até que de novo viessem instantes preciosos como aquele, de pura aceitação, de harmonia, de paz.
Olhais os Lírios do Campo, Erico Veríssimo

0 comments:
Enviar um comentário